Município de Goiânia e AGCM terão de indenizar alunos atingidos por spray de pimenta no ambiente escolar

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Wanessa Rodrigues

O município de Goiânia e a Agência da Guarda Civil Metropolitana de Goiânia (AGCM) foram condenados, de forma solidária, a indenizar 19 alunos da rede municipal de ensino que foram atingidos por spray de pimenta durante intervenção da guarda municipal no ambiente escolar. O caso aconteceu em maio de 2022. Os estudantes, com idades entre 11 e 14 anos, também sofreram agressões físicas e psicológicas, incluindo ameaças de morte. As mães das vítimas também serão indenizadas. Os valores atualizados chegam a R$ 735 mil. 

A juíza Simone Monteiro, da 2ª Vara da Fazenda Pública Municipal e de Registros Públicos de Goiânia, arbitrou R$ 15 mil, a título de danos morais, para cada um dos estudantes. E, de R$ 10 mil, para cada uma das genitoras (total de 17), valor referente aos danos morais reflexos (ricochete). Além dos honorários e custas processuais. 

Conforme os advogados Cícero Goulart de Assis, o escritório Goulart Advocacia, e Fernando Barcelos, da banca Barcelos Advocacia, os fatos geraram forte abalo emocional nas crianças e também em seus responsáveis. E apontaram ser inegável a ocorrência de dano moral por fato ilícito praticado pelos agentes estatais.

Os alunos relataram uso reiterado de spray de pimenta direcionado ao solo e, por vezes, às crianças; ameaças verbais graves, como a confissão de homicídios por parte de um dos guardas; sintomas físicos e emocionais imediatos, como vômito, desmaios, crises de ansiedade e dificuldade respiratória; e a necessidade de atendimento médico.

Contestação

O município de Goiânia alegou ausência de provas suficientes para embasar as acusações de abuso por parte de guardas municipais. Sustenta que não foi comprovado dano efetivo nem nexo causal entre os fatos narrados e qualquer conduta do ente público. Informa que houve abertura de sindicância, arquivada por ausência de irregularidades. A AGCM é revel.

Proteção constitucional especial

Contudo, a magistrada rejeitou o argumento do município quanto à ausência de prova do dano. Ela explicou que se trata de dano moral in re ipsa, pois deriva de situação flagrantemente atentatória à dignidade da pessoa humana, agravada pelo fato de atingir crianças e adolescentes, titulares de proteção constitucional especial. 

A juíza observou que a ocorrência dos danos é incontroversa, restando amplamente demonstrada nos termos de declarações colhidos pela Polícia Civil. E que a veracidade dos fatos foi confirmada pela sindicância administrativa instaurada pela Secretaria Municipal de Educação, que reconheceu a ocorrência das condutas por parte dos agentes públicos e instaurou processo disciplinar contra os envolvidos. 

Destacou que o parecer do Ministério Público foi enfático ao concluir que a conduta dos GCMs foi desarrazoada e violadora do dever de proteção às crianças no ambiente escolar, gerando abalo moral relevante.

Danos morais reflexos

A magistrada julgou procedente os pedidos de indenização por danos morais reflexos, considerando que os genitores testemunharam e foram diretamente afetados pelo sofrimento de seus filhos. “O que lhes causa legítima angústia, sendo esta plenamente indenizável, conforme entendimento da jurisprudência”, completou

Como aconteceu

Conforme relatado na ação, os alunos estavam reunidos na quadra da Escola Municipal D’Alka Leles, no Residencial Orlando de Morais, em Goiânia, quando o fato ocorreu. Na ocasião, eles recebiam orientação da diretora da unidade quando dois guardas municipais (um homem e uma mulher) se incomodaram com diálogos paralelos dos estudantes.

Disseram que os guardas adotaram uma série de comportamentos violentos e abusivos. Eles  aplicaram spray de pimenta no chão da quadra entre as fileiras de alunos, bem como nas salas de aula, sendo que parte dos estudantes precisou de atendimento médico e dos pais. 

Além disso, relataram que um dos guardas disse já ter matado quatro pessoas e que matar mais uma não faria diferença. E que ele ameaçou utilizar um objeto denominado “direitos humanos”  – que seria pedaço de mangueira para possíveis agressões físicas.