Impenhorabilidade de dinheiro mantido em aplicações financeiras: análise do artigo 833, inciso X, do CPC, e do Informativo 804, do STJ

Rebeca Hattori Costa*

A impenhorabilidade é um conceito fundamental no Direito brasileiro, garantindo a proteção de determinados bens contra a execução judicial por dívidas. Este artigo visa discutir as previsões de impenhorabilidade no Código de Processo Civil, com ênfase no artigo 833, inciso X, e também examinar o Recurso Especial 1.677.144-RS, que gerou o informativo 804 do Superior Tribunal de Justiça, trazendo contribuições significativas para a compreensão desse tema tão relevante no âmbito jurídico.

O artigo 833 do CPC estabelece um rol de bens que são considerados impenhoráveis, ou seja, não podem ser objeto de penhora para pagamento de dívidas. Dentre esses bens, o inciso X destaca a impenhorabilidade de “pequeno valor, que seja objeto de depósito ou aplicação em instituição financeira, até o limite de 40 salários mínimos”.

A impenhorabilidade prevista no inciso supracitado visa proteger valores de baixa monta depositados em caderneta de poupança, garantindo assim um mínimo de recursos para a subsistência do devedor. Essa medida reflete a preocupação do legislador em resguardar a dignidade da pessoa humana e evitar situações de penúria decorrentes da constrição de todo o patrimônio do executado.

No entanto, é importante destacar que essa impenhorabilidade não é absoluta, estando sujeita a algumas exceções e interpretações jurisprudenciais. Nesse contexto, o REsp 1.677.144-RS trouxe importantes reflexões sobre a aplicação desse dispositivo legal.

O REsp 1.677.144-RS, julgado pela Terceira Turma do STJ, discutiu a possibilidade de penhora de valores depositados em caderneta de poupança superiores a 40 salários-mínimos, tendo em vista que o dispositivo legal estabelece um limite para a impenhorabilidade. No caso em questão, o tribunal entendeu que, mesmo que o valor depositado ultrapasse o limite legal, a impenhorabilidade deve ser preservada até o montante previsto em lei.

Outrossim, estabeleceu-se que um investimento somente será considerado impenhorável se possuir características similares à poupança, sendo uma reserva contínua e duradoura de dinheiro destinada a proteger o indivíduo ou sua família em casos de emergência. Desta feita, dinheiro mantido em conta corrente tradicional ou remunerada, que não tem essa finalidade de reserva, não se enquadra nessa proteção automática.

A decisão sobre a penhorabilidade de valores em conta corrente depende de comprovação de que são absolutamente impenhoráveis, como o caso de verba salarial. Em síntese, a impenhorabilidade automática se aplica a valores depositados exclusivamente na poupança, até o limite de quarenta salários mínimos.

Ademais, o informativo 804 do STJ destacou que a impenhorabilidade visa assegurar a subsistência do devedor e de sua família, não sendo razoável permitir a penhora de valores essenciais para a sobrevivência do executado. Nesse sentido, a jurisprudência tem se mostrado sensível às questões sociais e humanitárias envolvidas na impenhorabilidade de pequenos valores depositados em caderneta de poupança.

É relevante ressaltar também que o STJ tem adotado uma postura mais flexível em relação à impenhorabilidade, considerando as peculiaridades de cada caso concreto e buscando soluções que conciliam a proteção do credor com a garantia dos direitos fundamentais do devedor.

Diante desse cenário, é fundamental que os operadores do Direito estejam atentos às recentes decisões do STJ a fim de compreenderem as nuances e os limites da impenhorabilidade prevista no artigo 833, inciso X, do CPC. A jurisprudência tem desempenhado um papel essencial na interpretação e aplicação das normas legais, contribuindo para a segurança jurídica e a justiça nas relações processuais.

*Rebeca Hattori Costa é advogada atuante nas áreas cível e imobiliário. Especialista em Direito Civil e Processo Civil. Integrante da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico (OAB/GO) e associada ao Instituto de Estudos Avançados em Direito (IEAD). A Rebeca está no LinkedIn: linkedin.com/in/ rebecahattori.